EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO.....
(espaço)...
Qualificação., por seu advogado adiante firmado, devidamente qualificado no instrumento procuratório incluso, com escritório profissional ....., endereço que indica onde recebe intimações, vem respeitosamente perante Vossa Excelência, propor a presente
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INTERPRETAÇÃO DE CLAUSULA CONTRATUAL C/C RESCISÓRIA E RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS
Qualificação, na pessoa de seu representante legal, pelos fatos e fundamentos que adiante seguem:
- Dos Fatos
- A Requerente celebrou CONTRATO DE ADESÃO DE COMPRA E VENDA PARA ENTREGA FUTURA, em 40 parcelas mensais, correspondentes a 2,5% (dois virgula cinco por cento) do valor estabelecido pela Requerida, para aquisição de uma motocicleta marca Honda, modelo BIS 125 ES.
- O referido bem seria entregue após completa quitação do mesmo ou mediante sorteio a titulo promocional, conforme estabelecido na clausula IV do contrato anexo.
- A requerida até a presente data pagou.... totalizando.....
- Face as dificuldades financeiras apresentadas pela Requerente, no dia ..... solicitou desistência por escrito junto a empresa Requerida. No entanto, ao verificar no contrato de adesão firmado pela Requerente, encontrou uma clausula de multa contratual que não havia sido informada no momento da assinatura.
- Outrossim, este fato fez com que a Requerente, juntamente com a notificação da desistência, questionasse quanto a formula de aplicação da multa, para após solicitar a restituição dos valores pagos.
- Como não obteve resposta, a única saída foi o ingresso da presente demanda, para questionar a validade da clausula XIII (concernente a multa contratual), bem como o pedido de devolução das parcelas já pagas.
- Da Interpretação da Clausula Contratual
- Estabelece a clausula XIII, do contrato firmado entre as partes:
"Fica estabelecida multa contratual de 50% (cinqüenta por cento) para ambas as partes em caso de desistência ou não do cumprimento do contrato ora firmado, podendo ser reduzida a multa para 40% (quarenta por cento) a multa, se o plano estiver encerrado."
- Em relação a aplicação da multa estabelecida na clausula acima mencionada, surge ambigüidade na sua interpretação, surgindo a seguinte questão: A multa de 50% incide sobre o valor de 01 parcela do contrato ou a multa de 50% incide sobre o total das parcelas pagas ou a multa incide sobre o valor total do bem?
- À luz do princípio da boa fé objetiva como método hermenêutico de interpretação do negócio Jurídico, estabelece o art. 423 do CC que: "Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente" (CC, art. 423).
- A assimetria negocial entre fornecedores e consumidores afasta a regra geral do Código Civil e remete o intérprete às normas especiais do Código de Defesa do Consumidor, em razão de específica previsão inserida no rol de direitos fundamentais (art. 5º, XXXII, CF). O déficit de informações do consumidor no mercado impõe que a lógica interpretativa de contratos padronizados e de adesão seja diferenciada. Se a incidência de cláusulas abusivas é algo possível nas relações de direito privado (direito comum e empresarial), o fenômeno se multiplica em larga escala nas relações em que impera a manifesta desigualdade negocial.
- Em matéria de relações consumeristas, a tendência contemporânea é examinar a "qualidade" da vontade manifestada pelo contratante mais fraco e não a manifestação em si, pois somente a vontade informada e educada é livre e legítima. Com espeque no princípio da transparência, o dever de informar assume tamanha relevância que, ao comentar o art. 46 do Código de Defesa do Consumidor, Cláudia Lima Marques enfatiza que "se o fornecedor descumprir este dever de 'dar oportunidade' ao consumidor de tomar conhecimento do conteúdo do contrato, sua sanção será ver desconsiderada a manifestação de vontade do consumidor, a aceitação, mesmo que o contrato já esteja assinado e o consenso formalizado. Em outras palavras, o contrato não tem seu efeito mínimo, seu efeito principal e nuclear que é obrigar, vincular as partes. Se não vincula não há contrato, o contrato de consumo, como que não existe, é mais do que ineficaz, é como que inexistente" (Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, p. 566.)
- Por via de conseqüência, determina o art. 47 do CDC que: "As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor".
- Por força da Súmula nº 181 do STJ: "É admissível ação declaratória, visando a obter certeza quanto à exata interpretação de cláusula contratual".
2.8. A interpretação mais favorável ao consumidor, sem dúvida nenhuma é a de que a multa de 50% incida sobre o valor de 01 parcela e não sobre os valores pagos ou sobre a totalidade dos bens, pois se assim o fosse, ensejaria abuso do direito, defeso em nosso ordenamento jurídico à luz do art. 187 do CC.
2.9. Pois bem. De antemão, convém observar que de uma leitura perfunctória do teor de cláusula apontada (XIII) é absolutamente impossível, a um qualquer consumidor, vislumbrar a possibilidade, no ato da contratação, de estar sendo lesado, mesmo porque, à vista da obscuridade do texto, a ciência da efetiva lesão somente se dá quando da desistência do contrato, o que, certamente, ocorre em raríssimos casos, beneficiando sobremaneira a demandada.
2.10. Vê-se clara, portanto, a violação a preceitos basilares do Código de Defesa do Consumidor que estabelece, dentre outras coisas, que são nulas de pleno direito as estipulações contratuais que subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga.
- Da desproporcionalidade do percentual de retenção por parte do contratante. Da violação ao estatuído no art. 51, II, do CDC.
- Entendendo Vossa Excelência para a aplicação da multa sobre os valores das parcelas já pagas, o limite estipulado pela Requerida é abusivo e contrário as normas que regem a relação de consumo.
- Da análise da estipulação contratual transcrita no item 2.1 supra denota-se que fica ali estabelecida a fixação de uma cláusula penal, vez que impõe ao consumidor uma pena, que se consubstancia na perda de um elevado percentual do montante pago, para o caso de desistência do contrato.
- Consoante leciona Orlando Gomes, "a cláusula penal, também chamada pena convencional, é o pacto acessório pelo qual as partes de um contrato fixam, de antemão, o valor das perdas e danos que por acaso se verifiquem em conseqüência de inexecução culposa de obrigação".
- Saliente-se, pois, que no caso em tela restou evidenciado que em havendo desistência do contrato por parte do consumidor caberia à demandada a retenção de vultosos percentuais calculados sobre (???) a totalidade do montante pago pelo consumidor, o que poderia atingir um patamar estratosférico de 50% (cinqüenta por cento), na hipótese de o consumidor desistir do contrato.
- Não se há contestar a abusividade da cláusula ali inserta, mesmo porque com o advento do Código de Defesa do Consumidor, a jurisprudência vem pacificando o entendimento de que a cláusula penal excessiva é abusiva, a teor do art. 51, inciso IV c/c o § 1º, do diploma legal mencionado, que assim reza:
"Art. 51 - São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam, incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade.
§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
I – ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
II – restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou o equilíbrio contratual;
III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso".
- A disposição legal ora transcrita, como todo o conteúdo do Código de Defesa do Consumidor veio impor um novo paradigma nas relações contratuais, o princípio da boa-fé objetiva, e deste modo a cláusula contratual que prevê o perdimento das quantias pagas, embora de forma gradual, mas determinando que o consumidor perca, ao final, quase tudo do que pagou, coloca o consumidor em desvantagem exagerada, pois este nada recebeu do fornecedor e, pagando as prestações, permitiu a este trabalhar com o seu dinheiro.
- Aí o que se há falar é que tal estipulação contratual, à evidência, ao colocar o consumidor em desvantagem exagerada em relação à demandada, rompe o justo equilíbrio que deve haver entre direitos e obrigações das partes contratantes, esbarrando frontalmente no princípio da boa-fé objetiva, que norteia as relações contratuais.
- O art. 51 do Código de Defesa do Consumidor apresenta um elenco de cláusulas abusivas, que ali estão enunciadas em "numerus apertus", o que deu margem à edição da Portaria de nº 04, de 13 de março de 1998, que tornando ainda mais claro o dispositivo supra citado, aponta condutas reconhecidamente abusivas, que estejam, portanto, em desacordo com o sistema de proteção contratual.
- No elenco, fixado na Portaria de n.º 04, no seu item 05, encontra-se a CLÁUSULA PENAL EXCESSIVA, que está definida como aquela que estabelece a perda total ou desproporcionada das prestações pagas pelo consumidor, em benefício do credor, que, em razão de desistência ou inadimplência, pleitear a resilição ou resolução do contrato.
- Complementando esta disposição a Portaria n.º 03, no item 03, também reputa abusiva e, portanto, nula de pleno direito, a cláusula que imponha a perda de parte significativa das prestações já quitadas em situações de venda a crédito, em caso de desistência por justa causa ou impossibilidade de cumprimento de obrigação pelo consumidor.
- Inconteste, a nosso ver, a teor do disposto no art. 51, IV, do CDC, do item 5 da Portaria de n.º 04, e do item 3 da Portaria de n.º 03, ambas da Secretaria de Direito Econômico, do Ministério da Justiça, que a cláusula contratual que prevê o perdimento das quantias pagas, embora de forma gradual, mas determinando que o consumidor perca, ao final, quase tudo do que pagou, é, claramente, abusiva, razão pela qual deve ser inibida judicialmente e, conseqüentemente eliminada dos contratos de adesão firmados pela demandada, evitando-se, assim, que o consumidor continue sofrendo prejuízos com a sua aplicação.
- Saliente-se, a teor do disposto no art. 6º, IV, do CDC, que é um direito basilar do consumidor modificar as cláusulas que estabeleçam prestações desproporcionais, cabendo, portanto, ao juiz revisar o conteúdo da estipulação contratual mencionada, fixando um percentual de perda moderado e evitando, de tal modo, que o consumidor seja exposto à desvantagem exagerada.
- Neste mesmo diapasão encontram-se julgados vários, dentre os quais transcrevemos estes:
COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. PERDA DAS PRESTAÇÕES PAGAS. PERCENTUAL QUE IMPÕE ÔNUS EXAGERADO PARA O PROMITENTE COMPRADOR. CONTRATO FIRMADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE DE REDUÇÃO PELO JUIZ. RAZOABILIDADE DA RETENÇÃO DE 10% DAS PARCELAS PAGAS. PRECEDENTES. RECURSO PARCIALMENTE ACOLHIDO. I – Assentado na instância monocrática que a aplicação da cláusula penal, como pactuada no compromisso de compra e venda de imóvel, importaria em ônus excessivo para o comprador, impondo-lhe, na prática, a perda da quase totalidade das prestações pagas, e atendendo-se ao espírito do que dispõe o art. 53 do Código de Defesa do Consumidor, cumpre ao Juiz adequar o percentual de perda das parcelas pagas a um montante razoável. II – A jurisprudência da Quarta Turma tem considerado razoável, em princípio, a retenção pelo promitente vendedor de 10% do total das parcelas quitadas pelo comprador, levando-se em conta que o vendedor fica com a propriedade do imóvel, podendo renegociá-lo. Recurso Especial n.º 85.936(96/0002502-9) – SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DEVOLUÇÃO DE PARCELAS PAGAS. PEDIDO DE DEVOLUÇÃO INTEGRAL. REDUÇÃO PROPORCIONAL. JULGAMENTO ULTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. ARTS. 924, CC, 128 E 460, CPC. RECURSO DESACOLHIDO. I – A jurisprudência desta Corte assentou o entendimento de que pode o juiz reduzir proporcionalmente a perda das quantias pagas pelo promissário adquirente nos casos de resolução de contrato de compra e venda celebrado antes da vigência do Código de Defesa do Consumidor, fixando-a em patamar justo, com base no art. 924 do Código Civil, que se traduz na aplicação do princípio geral de direito que veda o enriquecimento sem causa. II – Constatando expressamente do pedido a devolução integral das parcelas pagas, a acolhida parcial da pretensão para reduzir a pena estipulada em 100% (cem por cento) para 10% (dez por cento) não significa julgamento ultra petita. III – A correção monetária não se constitui em plus, mas em mera reposição do valor real da moeda, podendo incluir-se na condenação, independentemente de pedido expresso neste sentido. Recurso Especial n.º 284.157 – AL(2000/0108594-8), Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira
- Da inversão do ônus das provas
- Dentre as técnicas de repressão ao abuso do poder econômico ou à eventual superioridade de uma das partes em negócios que interessem à economia popular (como os sob exame) encontra-se o instituto da presunção a necessidade de restabelecer o equilíbrio entre as partes concorre para que se presuma, por parte dos aderentes, a falta de cognoscibilidade suficiente quanto ao alcance do contrato.
- Milita, pois, em favor dos Autores a presunção de que desconheciam o conteúdo lesivo do contrato à época em que foi celebrado, opera-se de plano a inversão do ônus da prova.
- Corroborando tal assertiva, os Autores pedem vênia para transcrever o pensamento de CARLOS MAXIMILIANO (Hermenêutica e Aplicação do Direito, Editora Forense, 8ª Ed., 1976, pgs.351/353):
Todas as presunções militam a favor do que recebeu, para assinar, um documento já feito. Ás vezes, pouco entende do assunto e comumente age com a máxima boa-fé: lê às pressas, desatento, confiante. É justo, portanto, que o elaborador do instrumento ou título sofra as conseqüências das próprias ambigüidades e imprecisões de linguagem, talvez propositadas, que levaram o outro a aceitar o pacto por o ter entendido em sentido inverso ao que convinha ao coobrigado(...) Palavras de uma proposta interpretam-se contra o proponente; de uma aceitação, contra o aceitante. Assim, pois, as dúvidas resultantes da obscuridade e imprecisão em apólice de seguro interpretam-se contra o segurador. PRESUME-SE QUE ELE CONHEÇA MELHOR O ASSUNTO E HAJA TIDO INÚMERAS OPORTUNIDADES PRÁTICAS DE VERIFICAR O MAL RESULTANTE DA REDAÇÃO, TALVEZ PROPOSITADAMENTE FEITA EM TERMOS EQUÍVOCOS, A FIM DE ATRAIR A CLIENTELA, A PRINCÍPIO, E DIMINUIR, DEPOIS, AS RESPONSABILIDADES DA EMPRESA na ocasião de pagar o sinistro(grifo nosso).
DO PEDIDO
À vista do quanto acima explanado, requer seja admitida a presente para o fim de:
A) Pela dúvida demonstrada, requer seja declarada por r. sentença qual a interpretação correta da mencionada cláusula contratual (intem XIII), de modo que a mesma por ser cumprida, observando a mais favorável para a Requerente.
B) Em pedido alternativo, havendo interpretação em relação a aplicação da multa sobre o valor das parcelas já pagas, em caráter de revisão judicial da cláusula questionada, seja a multa reduzida de 50% para 10% (dez por cento) sobre o valor das quantias pagas pelo consumidor, para retenção por parte da demandada.
C) Seja compelida a Requerida a devolver os valores das parcelas pagas no valor de R$......, devidamente atualizadas, deduzida a multa convencional a ser fixada por este H. Juízo.
D) A citação da demandada, na pessoa de seu representante legal, para, querendo, apresentar resposta no prazo legal, sob pena de revelia;
E) Requer outrossim, com base no art. 40 do CPP, seja enviado cópia da presente demanda juntamente com os documentos que a instruem para o Ministério Público Estadual, a fim de que o mesmo tome ciência das praticas abusivas e lesivas que a empresa Requerida vem exercendo em face dos consumidores, para que assim, promova a competente Ação Civil Pública (Lei 7347/85) e impeça que eventuais consumidores sejam lesados ainda mais.
F) Protesta provar o alegado por todos os meios de prova admitidos em direito, especialmente pela juntada de documentos e por tudo o que se fizer necessário à demonstração dos fatos articulados na peça exordial.
Dá-se à causa o valor de .
P. Deferimento.
Linhares – ES., 26 de fevereiro de 2009.
Dayvid Cuzzuol Pereira
Adv. OAB/ES 11.172
Rol de Documentos: Procuração; Cópia do contrato; copia das parcelas pagas.
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