ILICITUDE
Alguns autores também o denominam de antijuridicidade.
Conceito analítico. É o segundo substrato do delito pouco importa a doutrina adotada desde o causalismo até o funcionalismo radical(o fato típico é o primeiro).
Conceito material. Por ilicitude (ou antijuridicidade) entende-se a relação de contrariedade entre o fato típico e o ordenamento jurídico como um todo, inexistindo qualquer exceção determinando, incentivando ou permitindo a conduta atípica. Em resumo, trata-se de conduta típica não justificada.
RELAÇÃO ENTRE TIPICIDADE x ILICITUDE
Temos 04 correntes para tentar explicar o assunto.
- 1ª Corrente: AUTONOMIA ou ABSOLUTA INDEPENDÊNCIA. Tipicidade não gera qualquer juízo de valor no campo da ilicitude.
- 2ª Corrente: TEORIA DA INDICIARIEDADE ou "RATIO COGNOSCENDI". A tipicidade desperta indícios de ilicitude. Comprovando que o fato é típico gera suspeita – presunção de ilicitude. Se desaparece a ilicitude, desaparece o crime, mas o fato permanece. TEORIA QUE PREVALECE.
- 3ª Corrente: ABSOLUTA DEPENDÊNCIA ou "RATIO ESSENDI". A ilicitude é a essência da tipicidade. O fato típico só permanece típico se presente a ilicitude – se desaparece a ilicitude, desaparece tambpem a tipicidade (diferentemente das duas correntes anteriores). É neste que surge o TIPO TOTAL DO INJUSTO.
- 4ª Corrente: TEORIA NEGATIVA DOS ELEMENTOS NEGATIVOS DO TIPO. A teoria negativa dos elementos do tipo alcança os mesmos resultados da teoria da "ratio essendi", porém, por caminhos diversos. Diz que todo o tipo penal é constituído de elementos positivos e elementos negativos.
Elementos positivos
São elementos explícitos e devem estar presentes para que o fato seja típico.
Tipo penal
Elementos negativos
São implícitos e não podem estar presentes para que o fato seja típico.
Ex: Art. 121. Elemento positivo: matar alguém; Elemento negativo: Legitima defesa, estado de necessidade, exercício regular de um direito e estrito cumprimento do dever legal.
Esta teoria chega ao mesmo resultado da correte anterior, mas percorre o caminho diferente.
Interesse prático. O ônus da prova.
Teria da indiciariedade. O ônus da prova compete, no processo penal, a acusação que deverá comprovar o fato típico. Se a teoria da indiciaridade é a adotada, presume-se a ilicitude. Conseqüência – compete ao Réu comprovar a descriminante – não se aplica o in dubio pro réu, quando o ônus é dele. Teoria adotada.
Se a teoria for da ratio essendi, não se presume a ilicitude. Compete ao MP comprovar a ausente de discriminante (sobrecarga ao MP) – aplica-se o indúbio pro réu.
CAUSAS DE EXCLUSÃO DA ILICITUDE
Também chamada de DESCRIMINANTES ou JUSTIFICANTES.
Encontram-se espalhadas:
- Parte geral do CP:
Art. 23. Não há crime quando o agente pratica o fato:
I - em estado de necessidade;
II - em legítima defesa;
III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
- Parte especial do CP:
Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico:
Aborto necessário
I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
Aborto no caso de gravidez resultante de estupro
II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.
Exclusão do crime
Art. 142. Não constitui injúria ou difamação punível:
I - a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por procurador;
II - a opinião desfavorável da crítica literária, artística ou científica, salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar;
III - o conceito desfavorável emitido por funcionário público, em apreciação ou informação que preste no cumprimento de dever do ofício.
Parágrafo único. Nos casos dos nºs I e III, responde pela injúria ou pela difamação quem lhe dá publicidade.
OBS: Tem doutrina tratando essas hipóteses (128 e 142) como extinção da punibilidade. Mas prevalece com relação aos arts. 128 e 142 a natureza descriminante.
- Legislação Penal Especial
- Lei 9.605/98 –Lei de Crimes Ambientais (quando o animal te ataca, mesmo que em extinção, pode matá-lo)
- CF/88:
- Imunidade Parlamentar Absoluta (a doutrina é divergente).
OBS: Para o STF a Imunidade Parlamentar Absoluta exclui a tipicidade.
- Supra legal:
Consentimento do ofendido.
ESTADO DE NECESSIDADE
CP: Estado de necessidade
Art. 24. Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.
§ 1º Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo.
§ 2º Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito quando ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços.
Conceito. Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato típico, sacrificando um bem jurídico, para salvar de perigo atual direito próprio ou de terceiro, cujo o sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. Se há dois bens em perigo de lesão, o Estado permite que seja sacrificado um deles, pois, diante do caso concreto, a tutela penal não pode salvaguardar ambos.
REQUISITOS
- REQUISITOS OBJETIVOS. Encontram-se no art. 24 do CP:
- Deve haver um Perigo Atual - Esse perigo pode ser causado pelo homem, pela força da natureza ou por um animal (OBS: não tem destinatário certo).
P: Abrange o perigo iminente? R: A lei não abrange o perigo iminente. Temos duas correntes.
1ª corrente: Apesar do silencio da lei, abrange o perigo iminente – ninguém é obrigado aguardar o perigo iminente se transformar em atual para salvar o seu direito. Defendida por LFG.
2ª corrente: Não abrange o perigo iminente. Definem como perigo iminente é perigo do perigo - -é algo muito distante para autorizar que a pessoa saia prejudicando direitos alheios. Perigo iminente é algo futuro e incerto. Diz ainda que se quisesse abranger o iminente o teria feito como fez com a legitima defesa no art. 25. Defendida por Capez.
- A situação de perigo não pode ter sido causada voluntariamente pelo agente. Significa que o causador voluntario do delito não pode alegar estado de necessidade.
Conceito de causador voluntário. Temos duas correntes
1ª corrente: Tratando –se de descriminante (norma excludente de crime), merece interpretação restritiva, logo, só abrange a provocação dolosa do delito. A conduta culposa, poderá agir em estado de necessidade. Corrente majoritária.
2ª corrente: Não pode alegar estado de necessidade quem provocou dolosa ou culposamente o delito. Se fundamenta no art. 13, §2º, c, do CP: § 2º A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem: c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.
- Deve haver finalidade de salvar direito próprio ou alheio.
Estado de necessidade próprio – quando protege o direito próprio.
Estado de necessidade de terceiro – quando protege o direito de terceiro.
P: Para que eu possa agir em Estado de necessidade de terceiro é preciso da ratificação do terceiro? R: Tem divergência.
1ª corrente: Estado de necessidade de terceiro dispensa o consentimento ou ratificação do terceiro, porque a lei não exige – não cabendo ao interprete o exigir. Corrente majoritária.
2ª corrente: Estado de necessidade de terceiro exige o consentimento do 3º caso o bem colocado em perigo seja disponível. Só não exige o consentimento se o bem for indisponível.
- Inexistência do dever legal de enfrentar o perigo.
Existindo o dever legal, não pode alegar o estado de necessidade. Ex: Incêndio de um prédio e os primeiros a saírem correndo são os bombeiros. Enquanto o perigo comportar o enfrentamento – enfrente-o. No entanto, tornando insustentável é obvio que não se exige que o agente se torne um mártir.
P: Se tem um dever contratual pode alegar o estado de necessidade? R: Sim. Se por contrato a pessoa se obriga a segurar a vida de alguém poderá alegar estado de necessidade, como os seguranças particulares por exemplo. Somente o dever legal impõe o enfrentamento e não o dever contratual o moral.
P: Escolha de vitimas? Pode o bombeiro em um prédio em chamas onde o seu equipamento permite apenas salvar uma vida, escolher entre um idoso e uma criança? R: O Bombeiro tem o dever de salvar vidas. A escolha é um dever moral apenas. A vida de um menor não vale mais ou menos que a vida do idoso. Se ele pode salvar um, que salve.
- Inevitabilidade do comportamento lesivo.
O sacrifício de bem jurídico alheio é o único meio capaz de salvar direito próprio ou alheio. Não pode alegar estado de necessidade que opta por um meio mais cômodo.
- Inexigibilidade de sacrifício do direito ameaçado.
Critério da proporcionalidade entre bem protegido e bem sacrificado.
Proporcionalidade. Temos duas teorias discutindo sobre esse assunto:
Teoria diferenciadora Teoria unitária.
Estado de necessidade justificante – exclui a ilicitude. Ocorre quando o bem protegido vale mais que o bem sacrificado. Ex: Vida x patrimônio. | Só prevê o - Estado de necessidade justificante (exclui a ilicitude). Quando o bem protegido vale mais ou igual comparado com o bem justificado. |
Estado de necessidade exculpante – exclui a culpabilidade. Ocorre quando o bem protegido é igual ou menor o bem sacrificado. Pode excluir a culpabilidade, não mais a ilicitude. | Quando o bem vale menos é caso de mera redução de pena |
O CP adotou a teoria unitária.
OBS: Tem uma lei que adotou a teoria diferenciadora – Código Penal Militar. Art. 39 do CPM:
Estado de necessidade, como excludente de culpabilidade
Art. 39. Não é igualmente culpado quem, para proteger direito próprio ou de pessoa a quem está ligado por estreitas relações de parentesco ou afeição, contra perigo certo e atual, que não provocou, nem podia de outro modo evitar, sacrifica direito alheio, ainda quando superior ao direito protegido, desde que não lhe era razoavelmente exigível conduta diversa.
- REQUISITOS SUBJETIVOS
Conhecimento da situação de fato justificante. Ciência de que está diante de perigo atual.
A ação do estado de necessidade, como única possibilidade de afastar o perigo, deve ser objetivamente necessária e subjetivamente conduzida pela vontade de salvamento.
Questões de prova
P: É possível estado de necessidade em crime habitual e crime permanente? R: A maioria entende que não á cabível, justificando que, exigindo a lei como requisito a inevitabilidade do comportamento lesivo, bem como referindo-se as "circunstancias" do fato, não se tem admitido estado de necessidade em crimes habituais e permanentes.
P: Furto Famélico é caso de estado de necessidade? R: Furto Famélico pode configurar estado de necessidade, desde que preenchido os seguintes requisitos:
- Que o fato seja praticado para mitigar a fome.
- Inevitabilidade do comportamento lesivo - Que seja o único e derradeiro recurso do agente
- Subtração de coisa capaz de diretamente mitigar a fome.
- Insuficiência dos recursos auferidos ou inexistência de recursos.
É possível a alegação de furto famélico para pessoa empregada, ou a teoria é adotada para apenas mendigo? R: Está no 4º requisito. É possível sim que a pessoa empregada possa praticar o furto famélico. Ex: pai que sustenta sozinho uma família de 7 pessoas recebendo apenas 1 salário mínimo.
CLASSIFICAÇÕES DOUTRINÁRIAS
- Quanto a titularidade
- Estado de necessidade Próprio
- Estado de necessidade de Terceiro
- Quanto ao elemento subjetivo
- Estado de necessidade Real – o perigo existe efetivamente.
- Estado de necessidade Putativo – o perigo é fantasiado pelo agente. O perigo não existe. Este não exclui a ilicitude (não é descriminante).
- Quanto ao terceiro que sofre a ofensa
- Estado de necessidade Defensivo: O agente para salvar seu direito sacrifica bem do próprio causador do perigo. Não é ilícito penal, bem como, não é ilícito civil.
- Estado de necessidade Agressivo: O agente para salvar seu direito sacrifica bem de pessoa alheia a provocação do perigo. Não é ilícito penal, mas é ilícito civil.
OBS: Doutrinas dizem que se não é ilícito penal e não é ilícito civil. Está errado, como acima explicado, no estado de necessidade agressivo.
LEGITIMA DEFESA
CP, Legítima defesa
Art. 25. Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
Conceito. Art. 25.
P: Qual a diferença de legitima defesa para Estado de Necessidade? R: existem 03 diferenças.
ESTADO DE NECESSIDADE LEGITIMA DEFESA
Conflito entre vários bens jurídicos diante de uma situação de perigo. | Ameaça ou ataque a um bem jurídico. |
O perigo decorre de fato humano, animal ou da natureza (não tem destinatário certo). | Agressão humana (tem destinatário certo). |
Os interesses em conflito são legítimos. | Os interesses do agressor são ilegítimos. |
A ultima diferença fundamenta uma questão de concurso: É possível duas pessoas (uma em face da outra) agir em estado de necessidade? R: É perfeitamente possível estado de necessidade x estado de necessidade. Ex. clássico – 02 náufragos disputando um colete salva vidas.
P: è possível legitima defesa de legitima defesa? R: Não. A legitima defesa pressupõe a ilegitimidade da agressão.
REQUISITOS
- REQUISITOS OBJETIVOS:
- Agressão Injusta. Comportamento humano contrário ao direito, atacando ou colocando bens jurídicos em perigo.
P: Animal que ataca vítima. Com uma arma mata o animal. Legitima defesa ou estado de necessidade? R: Este problema não tem dados suficientes. O animal foi atacando espontaneamente representa um perigo – estado de necessidade; se o anima foi incentivado pelo dono é uma injusta agressão – legitima defesa.
P: Legitima defesa em omissão. É possível? R: Sim. A agressão injusta pode ser tanto uma ação como uma omissão. Ex: Preso que repele omissão do carcereiro que se recusa a cumprir o alvará de soltura.
Agressão tem que ser Injusta. A injustiça da agressão é analisado sob a consciência do agredido. Não importando de o agressor sabe ou não que a agressão é injusta. Se o agredido sabe que é injusta ele pode revidar.
P: Ataque de Doente Mental. Configura um perigo atual ou agressão injusta? R: se entende que é perigo atual, tem que fugir; se for agressão injusta pode repelir. Nelson Hungria diz que é agressão injusta porque está na consciência do agredido.
P: É possível legitima defesa real x legitima defesa putativa? R: Sim. Pois a putativa é injusta.
P: É possível legitima defesa putativa x legitima defesa putativa? R: A doutrina diz que é possível. Ex: Duas pessoas que tentam matar uma a outra passam por uma rua e ambas começam a atirar uma na outra.
P: A agressão injusta corresponde sempre a um fato típico? Ex. Legitima defesa contra furto de uso; de coisas insignificantes – são casos de legitima defesa onde não configura o fato típico. Assim, nem sempre a agressão injusta corresponde a fato típico.
- Atual ou iminente. Para configurar a legitima defesa, deve ser Atual: presente; ou Iminente: prestes a ocorrer.
- Agressão passada é mera vingança e não configura Legitima Defesa.
- Agressão futura é incerta: mera suposição e não configura Legitima Defesa.
OBS: Se a agressão futura for certa é hipótese de inexigibilidade de conduta diversa – causa supra legal de exclusão de culpabilidade (Fato típico, ilícito, mas não culpável). Tem jurisprudência nesse sentido, inclusive por Willian Douglas.
- Uso moderado dos meios necessários.
Meios necessários. É o meio menos lesivo a disposição do agente, porém, capaz de repelir a injusta agressão. Ex: Pedro agride Marcos com uma faca. Pedro tema sua disposição uma pedra, um calibre .38, uma bazuca e as habilidades físicas. Neste caso, o meio menos lesivo é as habilidades físicas, mas não é capaz de repelir uma injusta agressão. O meio necessário seria o calibre .38, pois a pedra também não é capaz de repelir a injusta agressão, desde que usada moderadamente.
Uso moderado. Atira primeiro para o chão, depois nas pernas e por fim na cabeça, desde que o agressor continue vindo em cima.
OBS: não usando moderadamente, aparece o excesso.
Lei 11.689/2008 (Juri) quesitos dos jurados
Antes da lei Depois da lei
Materialidade + Autoria | Materialidade + Autoria |
Nexo | Nexo |
Teses da defesa. Ex: Legitima defesa é subdividida:
Se os jurados negarem um e reconhecido os outros (Ex. Moderado), os jurados vão ser indagados do excesso de oficio. | O Jurado absolve o réu? Se a tese da defesa for legitima defesa, não é mais desdobrada em novos quesitos. O excesso não sai mais como desdobramento natural, deve ser defendido em plenário pela defesa. |
- Salvar direito próprio ou alheio.
- REQUISITO SUBJETIVO
Conhecimento do estado de agressão injusta. Ele tem que saber que estava atuando em legitima defesa.
Conceitos doutrinários
- Legitima defesa Defensiva. A reação do agredido não constitui fato típico.
- Legitima defesa Agressiva. A reação do agredido constitui fato típico.
- Legitima Defesa Subjetiva. É o excesso exculpável na legítima defesa, pois qualquer pessoa nas mesmas circunstancia de fato se excederia (elimina a culpabilidade). Nasce da negativa do excesso doloso e culposo. Com o advento da nova lei do Júri, o excesso somente será analisado se a defesa assim o fizer.
- Legitima Defesa Sucessiva. Ocorre na repulsa contra o excesso abusivo do agente agredido (temos duas legitimas defesas: uma depois da outra, pois a concomitante é impusivel se falar em legitima defesa). Ex: Pedro vem agredir Paulo com soco, para repelir a injusta agressão ele dá o soco primeiro e Pedro cai. Ao invés de parar, continua dando soco em Pedro (essa agressão de legitima passa para ilegítima). Pedro para se defender começa a dar socos em Paulo.
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